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Território da Música: Artigos (Rock)

quarta-feira, 26 de dezembro de 2007

The Who - Discografia Mostrada em Video

The who - The Who Sell Out (1967)



Uma obra-prima da pop art, The Who Sell Out esbanja uma ousadia quem mais tarde abandonaria esse volátil icone londrino do movimento mod. As hilariantes fotos da capa, de David Montgomery, revelam o conceito dessa cultura. O guitarrista e líder da banda, Pete Towshend, segura um tubo absurdamente desproporcional de Odorono - o desodorante "que transforma transpiração em inspiração". O cantor Roger Daltrey aparece numa banheira cheia de feijões cozidos com molho de tomate, abraçado a uma lata de Heinz (o primeiro fabricante de feijão em lata da Inglaterra). Na contracapa, o baterista Keith Moon aplica o creme Medac contra espinhas, e lê-se a informação de que o baixista John Entwistle "era um fracote de 60 kilos até que Charles Atlas o transformou num homem de 62 kilos" The Who Sell Out apresenta uma leitura satirica da relação entre música e propaganda. Townshend concebeu o album como uma transmissao de uma falsa radio pirata, intercalando as faixas de música com comerciais ficticios. Esses jingles ainda mantem seu apelo, embora o tempo tenha passado antes que a ideia pudesse ser totalmente compreendida. As canções são sensacionais. Um presente de Speedy Keen, futura estrela da banda Thunderclap Newman, "Armenia City in the sky" é um atordoante pacto entre o rock e o movimento psicodelico. "I can see for miles" foi o maior sucesso do The Who nos EUA: uma tempestade de harmonias dilatadas em tempos variados, com instrumentos ferinos, conduzida por um Moon em grande forma. Mas, em outras faixas, há um toque mais suave. "Mary Anne With the shaky Hand" soa como os Byrds; Daltrey surge afetado e obscuro em "Tatoo"; "Our Love Was" e "I can´t reach you" são melodias alegres. Finalmente, a náutica miniópera "Rael" aponta o caminho para Tommy e o superestrelato.

Pink Floyd - The Piper at The Gates of Dawn (1967)



Como banda da casa UFO Club em meados dos anos 60, o Pink Floyd começou uma revolução psicodelico-musical em Londres, rivalizando com a realizada pelo The Grateful Dead em São Francisco. Apesar do nome enganoso - roubado dos artistas de blues Pink Anderson e Floyd Council -, o Pink Floyd não era um grupo de hippies maltrapilhos se aventurando na musica negra, e sim um bando de estudantes de arquitetura e arte bem vestidos em busca de um som proprio. The Piper At the Gates of dawn atingiu esse objetivo com resultados fascinantes. O sucesso do album se deve a habilidade da banda em equilibrar a exploração sonora de seus shows ao vivo e a técnica de composição por trás de hits como "Arnold Lane" e "See Emily Play". Ninguém escrevia canções psicodélicas melhor do que Syd Barrett. Mesmo "Astronomy Domine" orbita ao redor de uma estrutura pop conhecida. No entanto, o compositor estava claramente lutando para controlar a musica e a mente, enquanto o baixista Roger Waters, o pianista Richard Wright e o baterista Nick Mason queriam decolar numa viagem espacial. Essa tensão fez com que a barroca "Matilda Mother" e jazzistica "Pow R to Toc H" funcionassem muito bem. A peça central do album é "Interstellar Overdrive", um passeio de foguete que dura dez minutos e contém a melhor execução de guitarra da banda antes da chegada de David Gilmore. Logo depois Syd Barrett teria um colapso mental e o grupo ganharia as diretrizes da guitarra épica de Gilmore. Waters se tornaria a força criativa da banda e alimentaria o fascinio do público com seu ciclo de canções conceituais. O Pink Floyd voaria mais alto, especialmente em Dark Side of the Moon, mas, com The Piper..., o grupo conseguiu capturar com perfeição a essencia psicodelica dos anos 60.

The Who - My Generation (1965)


O primeiro album do The Who, que hoje evoca o espirito de uma londrina Carnaby Street que nunca existiu, é apenas superficialmente um som Mod. Na verdade, My Generation é o som desesperado de uma banda jovem e confusa sobre sua identidade, explorada por pessoas mais velhas da industria do disco, e com apenas uma certeza: de sua assustadora energia e sua capacidade de canalizá-la para a música. O grupo mudou de nome três vezes ao longo dos anos, dispensou empresários e integrantes, trocou de gravadora e lançou um single que não fez sucesso (I´m The Face, composto por Pete Meaden el lançado em 1964 para tentar introduzir a banda na cena Mod). Daltrey, Townshend, Entwistle e o recém-chegado Keith Moon sabiam que seu primeiro album precisava chamar atenção. E conseguiram. Eles contrataram o produtor dos Kinks, Shel Talmy (para quem Townshend adaptou "I can´t Explain, que, com seus acordes cortantes, lembrava os primeiros sucessos dos Kinks), e gravaram um punhado de canções de ótima qualidade. Os destaques obvios são My Generation, na qual Daltrey simula um viciado em drogas balbuciando frases como a conhecidissima e sucinta "Hope i die before i get old"; "I don´t Mind", com suas sofisticadas harmonias vocais e riffs de guitarra que estavam alem do seu tempo; e "The Kids are Alright", quase o hino de uma geração, na qual Townshend ressalta (não pela ultima vez) as dificuldades da juventude. O The Who evoluiu de forma a se tornar uma fera sofisticada nos discos posteriores, mas a crueza de My Generation faz deste album um marco.

Lynyrd Skynyrd - Pronounced Leh-nerd Skin-nerd (1973)



Em 1973, Lynyrd Skynyrd surgiu dos pantanos da Flórida como se fosse um filho indesejado do novo Sul dos EUA, uma cultura ao mesmo tempo arrependida e desafiadora de sua herança maculada. Quando gravou seu album de estréia, o Skynyrd já estava afiado no som agil, embalado por frango frito dos bares e espeluncas de Dixieland, juntando, pelo caminho, um trio de guitarras ferozes, para complementar uma seção ritmica bem-ajustada e a voz poderosa de Ronnie Van Zant. O mais importante, porem, neste album - e para as incontaveis bandas que se inspiraram nele - eram as ambiguidades que diferenciavam o grupo. Os integrantes da banda pareciam confederados truculentos, mas sua musica tinha o toque dos imigrantes negros. Pronounced... exibia e tambem desafiava os estereotipos dos sulistas e a banda se tornou a primeira manifestação verdadeira do rock do Sul. Com um pouco de blues, um pouco de country e um pouco de The Who, o disco mostra o melhor dos riffs do rock na bombastica musica de abertura, "I ain´t the one", e na advertencia de Poison Whiskey. Se os rivais Allman Brothers tinham se aventurado no jazz num estilo hippie, o Skynyrd apresentava o mesmo virtuosismo, mas ancorado no blues. A acustica Mississippi Kid, é um boogie do Delta e Things Goin On, soa familiar, como se fosse tocada no bar vizinho. E há "Freebird", um fecho de tirar o folego, que transformou a banda em celebridade e colocou o album nas paradas. Meditativa, frágil, rica e comovente, essa musica é uma lição de rock em nove minutos, incluindo uma divertida explosão de guitarra raramente vista até então, e mesmo desde então.

Bob Marley And The Wailers - Catch a Fire (1973)


Em dezembro de 1971, em Londres, um Bob Marley maltrapilho adentrou o escritorio de Chris Blackwell, fundador da Island Records, em busca de uma chance. Também jamaicano, Blackwell viu ali uma oportunidade de ouro e adiantou US$ 6 mil para que Marley e sua banda, The Wailers, voltassem para a Jamaica e gravassem um album. De posse das fitas master, Blackwell recrutou musicos americanos de estudio, acrescentou guitarras de rock e teclados e encomendou uma capa bacana, no formato de um isqueiro Zippo. O álbum recebeu criticas entusiasmadas e preparou o terreno para a ascensão internacional do reggae. Este não foi apenas o primeiro album de reggae a entrar o mercado de rock, mas também a primeira parceria de Marley com os companheiros fundadores do Waillers, Peter Tosh e Bunny Livingstone. Sustentado pelas linhas de baixo fortes e disciplinadas de Aston Barrett e pelas notas ascendentes da guitarra de Tosh, o trio mostra a variedade de sua habilidade vocal, transmitindo sua mensagem engajada numa rica harmonia. A mágica faixa de abertura, "Concrete Jungle", traz o desespero diante da terrível pobreza dos guetos urbanos. A vigorosa "400 years", de Tosh, e a ameaçadora "Slave Driver" lembram o legado histórico opressivo da escravidão; em "No More Trouble", eles dizem "We don´t need trouble" e apresentam a solução num desafio - "What we need is love". Há ainda incursões a romances - a deliciosa "Stir It Up", com sua linha de baixo crescente e sinuosos solos de wah-wah (uma cortesia dos acréscimos feitos por Blackwell), leva à relaxante "Kinky Reggae", que tem um divertido jogo de repetições. Marley canta todas as faixas, à excecão de duas, mas Cath a Fire é, sem dúvida, o trabalho de uma banda ávida e cheia de energia criativa.

Mutantes no Estúdio: Liberdade Total



Há que ser dito: os Mutantes sempre puderam gozar da liberdade de fazer o que bem entendessem dentro dos estudios de gravação. Manoel Barenbein, produtor dos dois primeiros LP´s, lembra: "Era uma loucura. A parte musical era dirigida pelo Arnaldo, e rolavam mil idéias". E cita exemplos. O que se ouve parecido com o som de um chimbau invertido em "Le Premier Bonheur Du JOur" (faixa do primeiro LP) é o ruído de uma bomba flit (aquela usada antigamente para vaporizar inseticidas). Na gravação de "Bat Macumba" eles incluiram na mixagem uma das falas da Rita, tipo "Manoel, me um Kri-Kri" (uma marca de chocolate da época), gravadas acidentalmente. E para a gravação de "Panis at Circensis" foram convocados vários funcionários do estúdio, inclusive o proprio Barenbein, para que fizessem ruídos de mesa de jantar, com falas do tipo "me passa a salada", ruídos de talheres etc. Os primeiros LP´s foram gravados em quatro canais. Através do método de redução, eles conseguiam adicionar orquestra, percussao e vozes, bem no esquema Sgt. Peppers dos Beatles. Só que a maioria dos efeitos eram "criados" no estudio. Claudio Cesar Baptista, irmão mais velho de Arnaldo e Serginho, foi responsável pela invenção da maioria deles, como, por exemplo, um engenho que unia motor de maquina de costura e "tremolos" (efeitos que variam graves e agudos) para criar sons semelhantes aos de uma moto. E para a gravação de vozes "diferentes", Claudio bolou uma serie de truques, como a utilização de fones de ouvido ligados em caixas Leslie, ou microfones ligados a efeitos sintetizadores. Nas capas dos LPs dos Mutantes faltam muitos creditos importantes. O baterista do primeiro LP (que é o unico em quem Dinho não toca) é um tal de Dirceu, baiano, musico de estúdio. No mesmo LP Jorge Ben canta em "A minha menina". A dupla caipira que toca e canta com os Mutantes em "2001" do segundo LP, não é citada e ninguem (das pessoas envolvidas na produção do disco) se lembra do nome deles (aliás, os fão provalvelmente sequer desconfiavam que aquela entrada "caipira" em 2001, nao foi feita pelos Mutantes). E, ainda no mesmo LP, Liminha toca viola na faixa "Mágica" (ele ainda não era integrante do grupo). No LP A Divina Comédia ou Ando Meio Desligado, outro esquecimento importante: quem toca conga em "Ando Meio Desligado" e "Meu refrigerador não funciona" é Naná Vasconcelos (a gravação foi feita pouco antes dele viajar para a Europa).

Os Mutantes - Os Mutantes (1968)


Para o resto do mundo, o Brasil significava futebol, belos corpos e bossa nova. A frase "ditatura militar repressora" aparecia em poucos guias turísticos. A chegada dos hippies no verão de 67 trouxe a contracultura para o foco das atenções, com resultados devastadores. Liderados por jovens compositores como Gilberto Gil, Caetano Veloso, os tropicalistas pegaram tudo o que tinham ouvido em Londres e São Francisco e fizeram a coisa do seu jeito. A direita odiou seus cabelos, sua moralidade e as drogas; a esquerda detestou como eles corromperam a musica brasileira de raiz. Os Mutantes flutuavam nesse redemoinho - Rita Lee e os 3 irmão Baptista (apenas dois apareciam no palco). Quer saber de uma esquisitice? Dois minutos depois de começar a faixa de abertura, "Panis at Circensis", o toca-discos parece diminuir a rotação e parar. Quando a pessoas levanta para ver o que aconteceu, o aparelho volta a vida. E, quando senta novamente, a musica termina com os ruídos da banda fazendo uma refeição - uma sonoplastia da sala de jantar mencionada na letra. A iluminada "Minha Menina" vem a seguir, com as guitarras distorcidas e efeitos eletronicos feitos a mão pelo terceiro irmão Baptista. Parece um pop perfeito para ser tocado em Copacabana, mas o hippies estavam sendo fisicamente atacados de todos os lados. Em 1968, o governo brasileiro adotou o estado de exceção. Gilberto Gil e Caetano Veloso se exilaram; o tropicalismo evaporou. Os Mutantes, claramente incapazes de liderar qualquer revoulução, continuaram e, na verdade, cresceram em popularidade no inicio dos anos 70. Devem ser lembrados pela insana Bat Macumba ( o samba "Tomorrow Never Knows") e "Baby" (uma "Eleanor Rigby" erótica).

quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

T. Rex - Eletric Warrior (1971)


Marc Bolan é um dos personagens mais interessantes da história do rock. Com seu jeito de Byron moderno e um misticismo hippie - obscuro mais delicioso - Bolan sempre foi audacioso. Sua carreira consta de elouquecedores altos e baixos (ele escreveu ainda um best- seller de poesia, The Warlock of love), mas seu ponto maximo foi Eletric Warrior. Que, como tudo que fazia, é recheado de surpresas. o T. Rex ja tinha feito sucesso na Inglaterra - no entanto, Bolan queria angariar fiéis do outro lado do atlantico. Ele pegou a estrada com os novos integrantes da banda, o baixista Steve Currie e o baterista Bill Legend - chamado para ajudar na percussao, a cargo de Mickey Finn. O grupo começou a editar algumas faixas a caminho de Londres, Nova York e Los Angeles. Os singles lançados na ocasião apontavam para um som mais ousado, mas só quando Eletric Warrior saiu foi possivel constatar como era sensacional. A arte da capa resume a perigosa promessa de poder do rock, com Bolan empunhando a guitarra como uma aram, diante de um arsenal de amplificadores. No entanto, em vez de destruir o ouvinte num ataque sonoro quando a agulha baixa sobre o vinil...Warrior começa com a explosão abafada da guitarra, um delicioso contratempo e um convite para cantar "beneath the bebop moon" em "Mambo Sun". O lindo dedilhado acustico de "Cosmic Dancer" vem em seguida, com seu rico arranjo de cordas. E o disco segue desta forma, às vezes rouco e obsceno, às vezes mediativo e romantico. O single "Bang a Gong(Get it On)" chegou ao top 10 dos EUA, mas o T. Rex nunca conseguiu satisfazer a ambição de Bolan de virar uma estrela internacional.

Santana - Abraxas (1970)


"A musica é a união de dois amantes: a melodia e o ritmo.A melodia á mulher e o ritmo, o homem." - Carlos Santana, 1994


No verão de 1970, Carlos Santana, aos 22 anos, já acumulava vários discos de platina por um album no qual incluiu dois singles que entraram para os Top 40; fez uma performance inesquecivel diante de metade do mundo em Woodstock e ganhou uma crescente legião de fãs. Até hoje, quem faz sucesso na estréia é encorajado a continuar gravando aquilo que funcionou da primeira vez. Mas Santana aderiu ao freak rock de São Francisco, onde os artistas garimpavam sua imaginação e transformavam tudo o que descobriam em rock´n´roll. Santana elaborou um segundo disco que viajava para alem do rock, até o jazz e a salsa, no ritmo de um coração latino. Apesar de serem a face visivel da banda, Carlos e sua guitarra impecavel eram meros componentes de uma engrenagem extremamente talentosa, e em Abaraxas cada integrante do grupo marcou presença. Gregg Rolie foi o responsavel pelo orgão sedutor que transformou "Black Magic Woman" e "oye como Va" em classicos isntantaneos do radio, e tambem compôs os rocks mais pesados "Mother´s Daugther" e "Hope You´re Feeling Better", em que os riffs tipicos de Carlos pairam acima da musica. O baixista Dave Brown e o baterista Mike Shrieve assentaram, neste album, as bases do que seria uma das melhores e mais afiadas seções ritmicas da história da musica, e pavimentaram o caminho para os exuberantes címbalos e congas de Mike Carabello e Jose Areas. No lançamento de Abraxas, a Rolling Stone afirmou que Santana "pode fazer pela musica latina o que Chuck Berry fez pelo Blues". Quando i albúm chegou ao primeiro lugar nas paradas, já trazendo as batidas mais firmes que o establishment do rock já tinha ouvido, o prognóstico da revista pareceu até modesto.

Blue Cheer - Vincebus Eruptum (1968)



"Rock´n´roll...é 10% técnica e 90% atitude. Uma nota com atitude certa é mais eficiente do que 60 notas sem atitude". - Dickie Peterson, 2005


Foi ai que as coisas ficaram heavy de verdade. Inspirado no nome de um tipo de LSD que, por sua vez, havia sido batizado com a marca de um sabao em pó, esse trio de São Francisco aumentou as apostas no noise rock com seu album de estreia, pavimentando o caminho para os Stooges e o Zeppelin, do heavy metal ao rock experimental. Está certo que ja existia, nos anos 60, batida primal de inumeráveis bandas de garagem, mas nenhuma tinha estabelecido um padrão de som de abalar as estruturas, nem a intensidade de feedback do Blue Cheer. Daí o epíteto atribuído ao grupo:"mais alto do que Deus". Da primeira vez que o Blue Cheer tentou gravar Vincebus Eruptum, estourou a mesa de mixagem. Com as devidas precauções, a banda conseguiu fazer o melhor LP, disparado, de sua carreira, composto por quatro musicas originais e duas versões: uma leitura virulenta, ameaçadora e suja de "Summertime Blues", de Eddie Cochran (superior até a a versão poderosa do The Who), e o classico do blues "Rock me Baby". A primeira ficou entre os 20 maiores sucessos da parada americana, algo surpreendente, talvez, para uma banda mais interessada em atingir limites do volume e nada preocupada com a musicalidade. Eles não eram exatamente bons musicos, mas há alguma coisa de admiravel e hipnotico nos gritos extemporâneos e no barulho mas controlado, e nos berros de Dickie Peterson enquanto a banda literalmente chacoalha em "Parchment Farm". Da capa em roxo e prata ao espirito "cada vez mais alto", este disco é um importante marco dos primeiros tempos do Heavy Metal.



Love - Forever Changes (1967)



"Quando gravei o disco, achei que fosse morrer". - Arthur Lee, 2001


Em 1967, o Love era a banda mais festejada de Los Angeles, depois dos Byrds. A fase hits dos Byrds, porem, estava chegando ao fim, mas o Love não estava suficientemente preparado pra tomar seu lugar:era um grupo etinicamente misturado, com dois líderes negros que faziam uma musica de pouco apelo para o publico negro; as canções se alongavam por lados inteiros dos LP´s; e a dependencia de drogas da banda tinha aumentado vertiginosamente. No verão de 1967, o The Doors e Jimi Hendrix monopolizavam todas as glorias. Então, o Love voltou ao basico, planejando um album com o foco nas musicas. Quando Bruce Botnick chegou para produzir o disco, encontrou a banda em um estado tão lastimavel que, imediatamente, contratou musicos de estudio. Duas faixas, "The Daily Planet" e "Andmoreagain", foram gravadas num unico dia, e a banda ganhou uma folga para trabalhar em conjunto novamente ensair um punhado de musicas. Dali por diante, cada dia no estudio significava se dedicar a algumas canções e, depois, o grupo poderia sumir dali para aprender as proximas. A gravação do disco levou quatro meses, mas os resultados foram ineditos. Acid rock não era pra ser tocado com violão e orquestra sinfonica - ou era? Muito inovador para o gosto da Costa Oeste, o LP não conseguiu sequer alcançar o desempenho modesto dos discos anteriores da banda nas paradas dos EUA; na Inglaterra, porem, o album lembrava o jeito brincalhao e interiorando dos Beatles, Small Faces e Donovan (embora ouvido mais atento pudesse identificar o turbilhão dentro da banda e da própria Los Angeles no verão do Amor), e entrou para os Top 30. A essa altura, no entanto, a banda estava desmoronando e nunca recuperou sua força.

The Beatles - Sgt. Pepper´s Lonely Hearts Club Band (1967)


Vamos navegar de volta a 1967, quando os beatlemaniacos que haviam tentado achar o prumo com Ruber Soul e Revolver seriam recompensados com uma divertida fantasia musical, Sgt. Pepper...ficou 15 semanas no topo da parada da bilboard e ainda estava entre os cinco primeiros quando Magical Mystery Tour chegou à liderança, seis meses depois. Por quê? Porque a ampliação de horizontes proposta pelo album vinha ancorada em composições brilhantes. Desde a abertura contagiante de McCartney (que Jimi Hendrix tocou ao vivo dois dias depois de lançado o disco), passando pela caleidóscopica "Lucy in the sky with diamonds", de Lennon, até a atordoante "A Day in the life", composta pela dupla, cada musica é um tesouro. Apesar da omissão de "Strawberry fields forever" - o single provocativo que fez a ponte entre Revolver e Sgt. Pepper... -, o album contem elementos psicodelicos: filosofia oriental ("Within you without you", de Harrison), e menção a drogas (embora Lennon tenha negado as referencias ao LSD em "Lucy", McCartney deixou tudo claro com "Fixing a Hole"). O certificado de Sgt. Pepper...como uma obra da pop art foi conferido pela capa mais famosa da historia do disco. O designer Peter Blake imaginou primeiro uma caixa de presente. mas acabou optando por juntar na capa uma serie de recortes de cartolina (alguns rostos famosos - Jesus, Hitler, Gandhi - não sobreviveram à montagem final). O album causou um impacto sem precedentes. As radio o tocaram dias a fio. O critico Kenneth Tynan, do The Times, o classificou como "um momento decisivo na historia da civilização ocidental". Essa hiperbole ja nao se aplica, mais ficou um pop perfeito, no qual a ousadiae a musica se mesclaram para sempre.

sábado, 15 de dezembro de 2007

NICO - CHELSEA GIRL (1967)


Manhã de 18 de julho de 1988, Ibiza. Nico, a femme fatale do Velvet Underground, estava morta. Vítima de uma hemorragia cerebral após uma queda de bicicleta. Às vezes, a vida prega peças extremamente irônicas. Justamente ela, uma notívaga por excelência, alcoólatra e junky, despede-se num ensolarado passeio matinal. No dia seguinte, em Berlim, o cobiçado corpo de Christa Paffgen estava cremado. A idade e a nacionalidade de Nico (um anagrama de icon) é tema de discussão, pois uns dizem que ela nasceu em outubro em Colônia, (Alemanha) em 38 ou 44, enquanto outros afirmam que foi em março em Budapeste (Hungria), em 43.
Dúvidas à parte, sabe-se que a incursão musical dessa modelo e atriz (sua primeira aparição cinematográfica foi no filme La Dolce Vita, de Fellini), educada entre a França e a Itália, foi em 64, quando se mandou para Nova York e arrumou emprego como cantora de bar. Conheceu e fascinou Bob Dylan, que levou-a a Andy Wharol, que, por sua vez, nos idos de 65, apresentou-a ao recém-fundado Velvet Underground, em que permaneceu como cantora até 67, tendo participado apenas do primeiro LP do white light/white heat, da psicodelia americana. Ainda em 67, após sua participação no Exploding Plastic Inevitable (projeto multimídia do Velvet concebido por Wharol), a chanteuse optou pela carreira solo.
Dona de uma personalidade febril e suicida, era bastante descolada no jet set musical, se já não bastasse ser apadrinhada pelo mestre da pop art e ter adquirido uma controvertida fama com o Velvet. Tendo o badalado cineasta Paul Morrisey como manager, não foi difícil convencer o produtor Tom Wilson a gravar seu début como solista.
Chelsea Girl, o disco em questão, lançado em fins de 67, cujo título é quase homônimo ao filme de Andy Wharol (Chelsea Girls), é um dos trabalhos mais sensíveis e cinzentos da década de 60. Uma obra lapidada por sua insofismável melancolia, (re)visitando os porões proibidos da paixão, plenos de mistérios, medo e tristeza. Com cinco canções escritas pelos integrantes do Velvet – cujos destaques são a cold-ballad “The Winter Song” (John Cale) e a hipnótica “Chelsea Girls” (Lou Reed/ Sterling Morrison) - , três do então adolescente Jackson Browne (entre elas a arrepiante “These Days”), uma do outsider Tim Hardin e outra de Bob Dylan (“I’ll Keep It with Mine”), feita especialmente para ela, Chelsea Girl é um LP em que Nico, com sua voz suave e penetrante, melancólica e glacial, personifica-se como uma idiossincrática folk Singer, ladeada por arranjos orquestrais, sutis nuances psicodélicas e uma rockmântico gosto amargo de 60’s beat-ballads.Após a estréia em 67, a noirchanteuse (ilu)minada por uma vida errática, gravou até sua morte um total de nove LPs, sendo que durante sete anos esteve afastada da música, graças a sucessivas crises existenciais, sublimadas em gim e heroína. Entre seus memoráveis LPs, temos o folk-minimal Marble Index (produzido por John Cale, que sobre o fracasso comercial do disco declarou: “Como é possível vender o suicídio?”), o delicado semi-experimentalista Desert Shore, o clássico The End (em que fincada em seu harmônio minimal regrava “The End” (Doors) e a tradicional “Das Lied der Deutschen”), o gótico-claustrofóbico Drama of Exile (demonstrando também que, sem querer, apenas por uma questão de natureza, foi precursora da dark music) e o doloroso Câmera Obscura (um trabalho que, além da sublime cover de “My Funny Valentine”, conta com inserções de elementos do gênero pós-industrial). Hoje, sua obra, embora um tanto quanto obscura, legou uma irreparável influência que cantoras/compositoras contemporâneas como Danielle Dax e Diamanda Galas continuam a reciclar sob uma nova ótica.

THE JEFFERSON AIRPLANE - SURREALISTIC PILLOW (1967)


Nos dourados anos 60, quando o ácido ainda não era empastelado de anfetamina e o desbunde não era apenas pose, a música então desenvolvida era um anteparo imprescindível para o advento do flower power e uma de suas principais formas de expressão.
Foi neste contexto que, em 65, surgiu na explosão do rock californiano um dos grupos que mais caracterizou o San Francisco sound: The Jefferson Airplane, formado por Marty Balin, Signe Anderson (vocais), Paul Kantner, Jorma Kaukonen (guitarras, vocais), Bob Harvey (baixo) e Skip Spence (baterista). Junto a duas outras bandas locais – The Charlatans e The Warlocks (que depois se transformaria no Grateful Dead) -, o Airplane foi um dos criadores do acid rock, cujos primeiros lampejos encontravam-se logo no álbum de estréia: Jefferson Airplane Takes Off (66), já com o baixista Jack Casady no lugar de Bob Harvey. Depois do disco, as deserções do baterista Skip Spense (que saiu para formar o Moby Grape) e da cantora Signe Anderson (que se afastou por causa da gravidez) foram oportunos pretextos para o grupo atingir sua line up ideal, com a entrada de Spencer Dryden e, especialmente, de Grace Slick (que era vocalista do Great Society).
Com esta configuração, o Airplane gravou seu segundo LP, Surrealistic Pillow, um dos mais perfeitos retratos da geração psicodélica e de todo o west coast sound. Só de um modo genérico seria possível desmembrar sua complexidade, uma chapante pororoca na cabeça dos hippies perplexos: uma bateria técnica emigrada do jazz, um baixo bluesy e rebuscado, guitarras com riffs e longos solos revezando-se em atmosferas viajantes.
Mas era na voz de menina tarada de Grace Slick, nas afetadas harmonias de Marty Balin, e no toque folkster de Paul Kantner que residia o grande segredo: vocalizações sui generis Ique que soavam estranhas e divagantes. Somadas a isto, letras que misturavam Lewis Carrol (vide “White Rabbit”), deambulações herdadas da beat generation, pacifismo, rebeldia e – claro – muito amor.
Entre as onze canções que compunham este “travesseiro surrealista” revelavam-se obras-primas do Frisco Sound como o hino ao amor livre ”Somebody To Love” e a ode lisérgica “White Rabbit” (“Um comprimido te faz crescer/ um comprimido te faz encolher/ e aqueles que sua mãe te dá/ não fazem efeito nenhum”) ambas trazidas por Slick do repertório do Great Society. Não menos essenciais eram a hipnótica balada de amor “Today” (apaixonadamente cantada por Balin) e a ultra-inventiva “Plastic Fantastic Lover” – com vocais no melhor estilo rap (!) e ambientada em high lisergia. Mas havia muito mais: as belas passagens folk-psicodélicas detectadas em “My Best Friend”, “D.C.B.A.-25” e “How Do You Feel”, as pinceladas rockers que embalavam “She Has Funny Cars” e “3/5 Of A Mile In 10 Seconds”, a envolvente balada “Comin’ Back To Me” e o instrumental intimista de “Embryonic Journey”. Tudo isso fez de Surrealistic Pillow o álbum que definiu as diretrizes sonoras do grupo, numa trajetória impecável que se estenderia até 72.
Durante este período, o Airplane gravou mais sete álbuns – dois deles ao vivo – onde destrinchou a psicodelia em sua essência, descobrindo seus segredos, virtudes em que circunstâncias ela poderia se tornar “um bode”. Num processo de constantes mudanças passou a chamar-se Jefferson Starship (que, à exceção dos dois primeiros LPs, desonrou totalmente sua história) e, depois apenas Starship. Em 89, o Airplane voltou com a formação principal dos sixties e um novo disco, mas... nem chegou a decolar.

CREEDENCE CLEARWATER REVIVAL - WILLY AND THE POOR BOYS (1970)


Uma banda de carreira bastante singular, que levou quase uma década para alcançar o sucesso e, depois de pouco mais de dois anos no topo das paradas, foi se extinguindo gradativamente, até encerrar suas atividades de forma definitiva em outubro de 1972. Porém, sua trajetória acidentada foi suficiente para que conquistasse um lugar ao sol na história do rock’n’roll, talvez como a mais universal cult band de todos os tempos.
Tudo começou em 1959, na cidade de El Cerrito, na Califórnia, onde os irmãos Fogerty – Tom e John – encontraram em seus colegas de colégio Stu Cook e Doug “Cosmo” Clifford, respectivamente baixista e baterista, o complemento ideal para o crossover entre o country e o rhythm’n’blues que eles que eles pretendiam detonar com suas guitarras. O quarteto começou com o nome de The Blue Velvets, tocando no circuito local, mas só alcançaria uma modesta projeção como The Golliwogs, já em meados da década de 60. No entanto, seria como Creedence Clearwater Revival, nome que adotou a partir de 1967, que a banda começaria a sentir o doce gosto da fama. A fórmula musical deste êxito consistia na guitarra-ritmo de Tom, no baixo de Stu e na bateria de Doug, que formavam uma base ideal para secundar as criações do gênero de John C. Fogerty, expressas tanto por sua assinatura como também pelos riffs inconfundíveis de guitarra e os vocais rasgados que se tornariam marca registrada do som do Creedence.
O resultado não poderia ser outro: logo em seu álbum de estréia – batizado apenas com o nome da banda e lançado em 1968 – conseguiram obter uma vendagem excepcional, conquistando um disco de platina, prêmio que também seria atribuído aos cinco LPs subseqüentes da banda.Com o lançamento de Bayou Country e Green River no ano seguinte, o Creedence afirmaria sua posição de sucesso popular, sem contudo alterar as raízes de seu som. Ao mesmo tempo, músicas retiradas destes dois LPs,e lançadas em compacto – tais como “Proud Mary”, “Born on the Bayou”, “Bad Moon Rising” e “Green River” – tomavam de assalto os primeiros lugares das paradas. Em 1970, esta sucessão de hits seria ampliada com outro punhado de canções de John, enquanto a banda, no auge de sua forma criativa, entrava em estúdio para gravar o LP Willy and the Poor Boys, que se tornaria a sua obra-prima definitiva.
Um álbum recheado de clássicos: já na abertura, com o balanço do mega-hit “Down in the Córner”, o Creedence – e especialmente John – demonstrava um pique arrasador, que prosseguia nos riffs de rock’n’roll de “It Came out of the Sky” e na levada country da canção tradicional “Cotton Fields”, com direito a violões e arranjos vocais no melhor estilo de Nashville. Em seguida vinha a instrumental “Poorboy Shuffle”, com destaque para a gaita tocada por John, introduzindo o groove de “Feeling’ Blue”, que deixou registrados um dois mais contagiantes refrões característicos da banda.
O segundo lado começava com “Fortunate Son”, um exemplo clássico do trabalho excepcional de guitarras dos irmãos Fogerty, que prosseguia com violões no country “Don´t Look Now (It Ain’t You or Me)”. Na seqüência vinha a inspirada versão da banda para “The Midnight Special”, a clássica canção de Leadbelly, e depois o rhythm’n’blues instrumental “Side O’the Road”, outro prato cheio para os riffs e solos do John. É ele mesmo que acaba a festa na última faixa do LP, “Effigy”, um psycho-country com um trabalho de bordão de guitarra inspirado na surf music. Um disco primoroso, com um brilho que nenhum dos três álbuns posteriores do Creedence – Cosmo’s Factory (1970), Pendulum (1971) e Mardi Grãs (1972, este já sem a guitarra de Tom) – conseguiu superar.

Iggy Pop - The Idiot (1977)


Uma escolha insegura. Afinal, os dois LPs com os Stooges são punk puro sete anos antes dos Sex Pistols. Raw Power (72) é uma escarrada anfetaminada na cara do flower power. O semipirata Metalic K.O. é demência pura. O mundo dos espetáculos não via esse desprezo insolente pelo bem ou pelo “bem” desde as conferências vociferadas por Antonin Artaud, na década de 30. Segundo o Iggy de hoje, 39 anos de idade, talvez não precise mesmo ver de novo. Artaud morreu internado, Iggy foi salvo por David Bowie.
Gravado nos estúdios Hansa (Berlim Ocidental) e do Chateau d’Herouville (Paris), The Idiot tem, de fato, uma mão de Bowie além do que gostariam os raros e radicais fãs do Iguana. Na famosa “centena básica” do New Musical Express só entrou o posterior, Lust for Life. No lançamento, a crítica desceu a lenha, irritada pelo mesmo motivo.
O disco não esconde. “Música composta por Iggy Pop e sua banda, gravado por David Bowie” são os créditos dados na capa, e as oito faixas são atribuídas à parceria Bowie/Pop (ou Jones/Osterberg).
“Sister Midnight” abre, dando o tom e a paisagem gerais do disco: paredes ondulantes montadas à base de guitarras distorcidas e sobrepostas em vários canais, uma ou outra intervenção eletrônica à moda de Brian Eno – com quem Bowie começava a gravar a “trilogia berlinense”. Em Lodger (79), inclusive – o terceiro da série - , “Sister Midnight” aparece com o título “Red Money” e uma nova letra feita por Bowie.
Na história da “Irmã Meia-Noite”, porém, irrompe o segundo delírio edípico da história do rock’n’roll, tão denso quanto o de Jim Morrison.Em suas “memórias”, I Need More, Iggy conta a fonte de inspiração. Uma vez, quando quase adolescente, estava começando a se entender com a filha de uma família vizinha, quando seu pai o chamou e o proibiu de chegar perto da garota. “Chamando irmã meia-noite/ sabe, tive um sonho essa noite/ mamãe estava na minha cama/ eu fazia amor com ela/ meu pai veio me caçar com sua pistola de seis tiros/ chamando irmã meia-noite/ que é que eu posso fazer com os meus sonhos?”
Na seqüência, a música que seria a faixa-título de um LP também antológico, de Grace Jones. “Nightclubbing” poderia ser o hino do vampirismo e das madrugadas viradas em festa, mas tem um andamento lento, quase fúnebre. Iggy se esparrama sobre ele como o crooner que Peter Murphy adoraria ser. Nightclubbing estamos Nightclubbing, andamos como um fantasma/ aprendemos novas danças, como a bomba nuclear.”
A faixa seguinte, “Funtime” (título do segundo dos Stooges), faz uma ponta no filme The Hunger (fome de viver) e não só pelo verso “a noite passada, estive no laboratório, conversando com Drácula e sua turma”. Entre ela e “Nightclubbing”, a mesma rede de conexões entre diversão e cinismo, que vai avolumando como uma nuvem cinza-chumbo no primeiro lado do disco para baixar a chuva ácida, que vem do outro.
Antes porém, mais duas faixas. “Baby” sai do tom de lamento para cantar: “Baby, você é tão limpa/ por favor continue limpa/ baby, você é tão jovem/ por favor continue jovem/ baby, não chore/ nós já choramos”. A última o mundo inteiro conhece na gravação de Bowie, que foihit em 83 (segundo consta, só os direitos autorais de “China Girl” tiraram Iggy de uma situação de penúria eterna). Aqui, ela obedece ao tom do LP, simultaneamente mais lúgubre e mais sóbria que a de Bowie. O lado B tem apenas três faixas. “Tiny Girls” é uma pérola de romantismo e decepção, com um belo solo de sax do anjo da guarda salvador.Está encravada entre “Dum Dum Boys”, um olhar nostálgico para os Stooges, e a tecno-esquizóide “Mass Production”. Ambas longas e soturnas, e Iggy bufa com o sopro do demo, mas para se chegar ao oásis de “Tiny Girls” você precisa passar por uma das duas.

Black Sabbath - Black Sabbath (1970)



No início de 70, um então desconhecido quarteto da cidade inglesa de Birmingham chocaria a Europa ao gravar um álbum que ultrapassava todas as fronteiras da brutalidade sonora que eram conhecidas até então.
Muitas bandas já tocavam alto na época: The Who, Cream, Deep Purple, Led Zeppelin e o pré-punk de Detroit (The Stooges e MC5). O heavy do Black Sabbath, no entanto, era diferente – mórbido, cruel, demoníaco. Enquanto o psicodelismo dos hippies ainda ecoava por todo o mundo e o rock progressivo passava por seu período mais promissor, o vocalista Ozzy Osbourne declarava: “Nossa música é uma reação a toda essa babaquice de paz, amor, e felicidade. Os hippies ficam tentando te convencer que o mundo é uma maravilha, mas é só olhar ao redor para ver me que merda nós estamos”.
Ozzy tinha todas as razões para reclamar da vida: teve uma infância pobre e passou boa parte de sua adolescência trancado nas cadeias de Aston, o bairro miserável de sua cidade natal. Em 67 resolveu montar um grupo com o guitarrista Tony Iommi, o baixista Terry “Geezer” Butler e o baterista Bill Ward, começando a tocar no circuito de bares por cachês irrisórios. Como resultado direto de suas frustrações e problemas financeiros, viram seu som se tornar mais sujo e agressivo a cada dia.
Black Sabbath, o álbum de estréia do grupo – lançado numa sexta-feira, 13 de fevereiro - , foi a válvula de escape de toda essa revolta acumulada ao longo de três anos de estrada. A violência condensada em vinil. Da abertura da faixa título, com o som de chuva e sinos, até o último acorde de “Warning”, tínhamos um festival de acordes tonitroantes, vocais ensandecidos e ritmo pulsante. Os temas abordados – missas negras, encontros com Lúcifer e predições catastróficas – eram frutos, principalmente, da leitura exaustiva das obras do inglês Dennis Wheatley. Três músicas deste LP, ao menos, ficariam marcadas para sempre na história do heavy: a já citada “Black Sabbath”, “The Wisard” e “N.I.B.”. Junto a “Behind The Walls Of Sllep” (inspirada num livro de H.P. Lovecraft), “Evil Woman, Don’t Play Your Games With Me”, Sleeping Village”,”Warning” e, em algumas edições, a faixa-extra “Wicked World” (lançada no mês anterior como o primeiro compacto da banda), formam um álbum fundamental e precursor do que se viria a fazer em termos de rock pesado.
Com sua sonoridade única, o heavy do Black Sabbath não nasceu de nenhum desdobramento de outro gênero, mas surgiu num rompante de ousadia de quatro músicos moldados pelas dificuldades e pela revolta contra o establishment “bicho-grilo”. Enquanto o rock progressivo promovia viagens por paisagens idílicas, o Black Sabbath oferecia uma passagem sem volta ao inferno. Nesse contexto, a banda viveria momentos de glória até 75, com o lançamento de seu sexto LP, Sabotage. Depois entrou em lento processo de decadência, movido por batalhas egocêntricas.No entanto, o grupo permanece como um dos mais subestimados de todos os tempos. É bem verdade que o heavy tem uma incrível facilidade em gerar mediocridades, dando farta munição para os detratores do gênero. Mas é admissível que a importância do Black Sabbath ainda seja posta em dúvida no momento em que algumas das mais conceituadas bandas da atualidade – como o Faith No More e o Soundgarden – se declaram tão influenciadas por seu som.

Talking Heads - 77 (1977)



Uma história verdadeira: era uma vez uma banda que, sem sombra de dúvida, merecia ter os seus quatro primeiros álbuns em qualquer lista de “melhores de todos os tempos”. Sob este aspecto, além de sua formação relativamente recente, este fato se tornaria ainda mais incrível ao constatar-se que seus membros – depois de incursões solo e/ou com outros músicos e grupos – voltariam a se reunir para apresentar durante a década seguinte um sólido trabalho que, se já não possuía o mesmo teor inovador de sua fase anterior, ainda primava pela coesão e integridade.
Pois bem... O nome desta banda era (e ainda é) Talking Heads e os álbuns acima citados intitulavam-se ’77, More Songs About Buildings and Food (1978), Fear of Music (1979) e Remain in Light (1980). Estes três últimos LPs, porém, já contavam com as mãos do “não-músico” Brian Eno na produção. Eno, que anteriormente havia produzido uma fita demo com o Television – algo como uma “banda-gêmea” dessa primeira fase dos Heads - , partiu desta experiência abortada para uma profícua e crescente colaboração com as “cabeças falantes” e especialmente com seu band leader, David Byrne (que se estenderia inclusive ao LP My life in the Bush of of the Ghosts, feito em colaboração com Eno, em 1980). Estaconjunção levaria ao som dos Heads para oceanos musicais nunca dantes navegados e, em sua gradativa fusão de sons eletrônicos com polirritmia percussiva, influenciaria de modo incisivo o panorama da música pop dos anos 80.
No entanto, a gênese desta estética já estava condensada na despojada instrumentalização e na força das composições de seu LP de estréia, ’77. Um álbum que transcendia por sua criatividade os próprios limites do cenário insurgente do punk-rock nova-iorquino depurando esta energia bruta através da sutileza instrumental e com isso conseguindo um resultado excepcionalmente original dentro de um contexto de absoluta efervescência criativa, em que despontavam nomes como Patti Smith, Ramones, Blondie e outros que tornaram legendário o então obscuro clube noturno CBGB, em Nova York.
No caso dos Heads, o núcleo inicial surgiu quando David Byrne decidiu formar uma banda, junto com seu colega da Rhode Island School of Design, Chris Frantz, também baterista. Eles chegaram a fazer algumas apresentações, às vezes denominando-se The Artistics, e outras, The Autistics. Mas a idéia só tomou fôlego quando convocaram a namorada de Chris, Martina Weymouth, para o baixo e mudaram-se para Nova York, em 1974. Já como Talking Heads, o trio começou a se destacar no circuito local, mas foi a entrada de Jerry Harrison (ex-Modem Lovers) na segunda guitarra e teclados que daria um formato definitivo ao som da banda.
Com essa formaçãoe eles entraram em um pequeno estúdio durante janeiro de 1977 para as sessões de gravação de seu LP de estréia, um álbum extraordinário, dadas as circunstâncias em que foi feito. O clima no estúdio era de tensão permanente entre a banda e um dos produtores, Tony Bongiovi, que a princípio queria outros músicos tocando os instrumentos no disco por não considerá-los suficientemente competentes. Por seu lado, Byrne recusava-se a gravar qualquer vocal com a presença de Bongiovi no estúdio. Por sorte, nesse impasse prevaleceu a concepção da banda, que forjou uma trama musical ímpar para as canções de Byrne, repletas de observações cortantes a respeito das relações interpessoais (“Tentative Decisions”, “The Book I Read”, “Pulled Up”) e perpassadas pela mais fina ironia (“No Compassion”, “Don’t Worry About the Government”). Em resumo, um álbum único, assim como cada um dos três que o sucederam. Ou como afirmava o próprio Byrne em “Psycho Killer”: “Diga algo uma vez/ Para que dizê-lo novamente?”.

Jimi Hendrix Experience - Eletric Ladyland (1968)




Hendrix transformou a linguagem e expandiu os horizontes da guitarra elétrica no rock. Sua concepção musical transpunha fronteiras das classificações, resgatando toda a tradição da música negra, ao mesmo tempo que apontava as principais tendências que viriam a emergir na década de 70 (heavy metal, jazz-rock, progressivo). A naturalidade com que arrancava – de inúmeras maneiras – inacreditáveis solos de sua Fender e criava melodias com efeitos de pedais e microfonias, era espantosa. Jimi ao vivo – incendiário em Monterey ou lançando bombas no Hino Nacional americano em Woodstock – fazia de sua guitarra uma extensão de seu próprio corpo e alma.
Mas também existia um “outro” Jimi: aquele dos estúdios e jam sessions, um experimentador fascinado pelo desenvolvimento das técnicas de gravação e efeitos, e que mais tarde montaria seu próprio estúdio (o Eletric Lady, em Nova York). A interação mais perfeita dessas duas facetas de Jimi ocorre extamente no terceiro e último álbum que ele gravou com o Experience: o duplo Eletric Lady Land. O seu primeiro LP era pura explosão: uma transposição para o vinil da energia em estado bruto que emanava do som de Hendrix. Depois veio Axis: Bold as Love, com seus temas lisérgicos e maior elaboração no trabalho de estúdio, através de recursos técnicos então inovadores como o pan (efeito de estéreo em que um som passa de um canal a outro).
Em Eletric Ladyland estes experimentos de estúdios foram levados adiante. Mais do que nunca, Jimi sentia-se à vontade para ousar. Isso já se nota superposição de efeitos da vinheta introdutória “And the Gods Made Love”. “Você já esteve na terra das mulheres elétricas/ O tepete mágico espera por você / Então não se atrase” canta Jimi na faixa título. É o convite para uma viagem que segue atrvés do tráfego da cidade e depois envereda pelos blues rasgado em “Voodoo Chile”. O lado 2 começa com duas boas canções, mas menores em relação ao conjunto: Little Miss Strange” (do baixista Noel Redding) e “Long Hot Summer Night”. Mas ganha corpo novamente a partir de uma versão de “Come On” de Earl King e torna a brilhar no funk sincopado de “Gipsy Eyes” e nas linhas melódicas de “The Burning of the Midnight Lamp”.
O segundo disco começa com a longa introdução tendendo para o blues de “Rainy Day, Dream Away”; o lado 3 conta apenas com mais duas músicas, que na verdade são uma única suíte, na qual vários climas se sucedem de maneira sublime. Nom último lado do disco há “Still Raining, Still Dreaming” – uma recriação da faixa que abre o lado 3 – que é seguida pelo pique de “Houses Burning Down”, para encerrar-se com duas faixas geniais: “All Along the Watochtower”, a versão definitiva da canção de Dylan, e “Voodoo Chile (Slight Return)”, outra recriação estupenda que abre espaços para novos vôos de Hendrix. Esse disco expõe as “drogas” mais pesadas que fizeram sua cabeça: blues, funk e rock’n’roll. Uma fórmula simples, que ele “dosava” com sua guitarra, seu fuzz e seu wah-wah. Só mesmo Syd Barrett conseguiu (um ano antes) pintar com cores psicodélicas um painel tão significativo, tão adiante das manias musicais da época – como o blues branco e o rhythm & blues.
O lançamento de Eletric Lady Land coincidiu com o fim do Experience (Jimi, Noel e Mitch Mitchell na bateria) Hendrix iria montar a Band Of Gipsies, com o baixista Billy Miles (ex-Eletric Flag), gravando um disco ao vivo do show realizado no Fillmore East (em Nova York) na noite de ano novo 69/70. Novamente com Mitchell no lugar de Buddy Miles, Jimi faria “The Cry of Love”, seu último disco antes de morrer repentinamente aos 27 anos (18/09/1970). Uma vida curta, um enorme legado.

quarta-feira, 12 de dezembro de 2007

Parliament - Mothership Connection (1976)









"Naquela época, quando todo mundo tomava ácido, havia uma chance de se fazer as coisas do jeito que a gente queria". - George Clinton, 2002

Inspirado pela linha de produção sonora da Motown, George Clinton construiu gradualmente a nave espacial funk que era o Parliament-Funkadelic: dois grupos, vários projetos paralelos e mais de 50 músicos, incluindo a estrela do sax Maceo Parker e o deus do baixo Bootsy Collins. Mothership Connection -- o terceiro e melhor album do Parliament -- é uma prova da força absoluta de sua capacidade musical e inovação. A capa mostra Clinton de braços e pernas abertos, fantasiado de astronauta, mas a bordo de botas de cano alto e saltos plataforma, pulando de uma nave espacial -- e isso é o mais perto que uma foto poderia chegar para descrever o conteúdo do album. Sob a orientação de Clinton, o Parliament pegou o Funk, lavou com acid, vestiu com uma roupagem de ficção cientifica e embrulhou numa atitude cool. O resultado são sete faixas de R&B perfeito e incansavel, arranjado de forma imaculada por Colllins, Clinton, o Trombonista Fred Wesley eo tecladista Bernie Worrel. "P-Funk (Wants to get funked up)" anuncia o que está por vir. Clinton começa suavemente, cantando contra suas lânguidas linhas de baixo -- aí, acelera ao maximo e deixa os sintetizadores, metais e harmonias tomarem conta. Dali por diante, cada faixa é uma explosão de ritmos entrelaçados. As inovações de Mothership Connection o tornaram o melhor disco de funk de todos os tempos. Um grande sucesso na época ("Tear the roof off the sucker" foi o maior hit do Parliament entre os hots 100), o álbum mudou a maneira como as pessoas viam o funk e o R&B. Décadas depois, o impacto deste LP ainda ressoa no trabalho de rappers como Warren G. e Snoop Dogg, e em roqueiros como os Red Hot Chili Peppers e o Primus. O legado de "P-funk" fez de Clinton e Cia. um dos mais importantes grupos da história da música nos Estado Unidos.

Kiss - Destroyer (1976)




Solos de guitarra flamenca e copias de Beethoven nao sao elementos obvios para o sucesso, especialmente para uma banda de rock´n roll de revista em quadrinhos, famosa por "Rock and Roll all Nite".Ainda assim, Destroyer é o album simbolo do Kiss. Alive! (1975) marcou o fim da fase primal do grupo, deixando o Kiss livre para novas experiencias. Foi entao que chegou o produtor Bob Ezrin, que havia afiado suas armas com Lou Reed e Alice Cooper. Ele tinha uma visao de que a banda era "uma caricatura de tudo que mobiliza a juventude" e pressionou o grupo a ir alem da simples provocação de seus trabalhos anteriores. Os resultados incluiram hinos duradouros, em especial "Detroit Rock City" (na qual há o solo flamenco supracitado) e "God of Thunder" (uma musica de Paul Stanley que se tornou marca registrada de Gene Simons). Havia tambem esquisitices, como a balada "Beth", um hit, e "Great Expectations", que traz a incursao de Ezrin à "Pathétique", de Beethoven. ("Eu rio cada vez que ouço essa faixa", confessou ele ao biografo do Kiss, Ken Sharp.) Ezrin encarregou o produtor Kim Fowley, de Los Angeles, de ajudar com a pomposa "King of the Night Time World" e com "Do you love me?". Numa tentativa de aumentar o tempo de duração da gravação, ele acrescentou colagens de sons no inicio e no fim -- uma faixa final lúgubre, de 86 segundos, mistura pedaçoes anteriores de Destroyer e um fragmento de Alive!. Este pacote vinha embalado pela pintura expressiva de Ken Kelly, primo do artista Frank Frazetta. Joe Elliot, do Def Leppard, afirmou: "Comprei o disco so pela capa". Os fãs debatem ate hoje, os méritos de Destroyer, uma discussão alimentada pela revelação de que Ezrin dispensou o guitarrista Ace Frehley de duas faixas. Mas a banda passou o resto de sua carreira tentando igualar a qualidade deste album.

Rush - Moving Pictures (1981)



Desde meados dos anos 70, o Rush vinha sendo uma grande atração em shows. Também foi uma das poucas bandas de rock progressivo que soube mudar e se adaptar à New Wave. Em 1980, o trio de Ontário simplificou o seu som no setimo LP de estudio, Permanent Waves, que refletia influencias do Police, do Talkin Heads e de Peter Gabriel. O disco continha o sucesso "Spirit of Radio", uma mistura exuberante de pop, metal e ska, com a qual o letrista e baterista Neil Peart demonstrou que conseguia escrever musicas sobre temas universais. A banda também estava fazendo experiencias com uma instrumentação diferente. O baixista e cantor Geddy Lee passou a tocar os sintetizadores Minimoog, Oberheim e Moog Taurus. Ele fazia varias coisas ao mesmo tempo no palco, usando todos os membros do corpo para recriar os avanços tecnologicos presentes no disco. O LP seguinte seria ainda mais bem realizado, apesar da piada que juntava seu titulo com a foto da capa. Moving Pictures começa com o sucesso de radio "Tom Sawyer". Esta ode ao individualismo sobrepoe os rifs virtuosos da guitarra pesada de Alex Lefeson a texturas eletronicas de fundo, enquanto Peart dispara viradas rápidas de bateria para sustentar o todo. A voz melodica de Lee ilumina o pedido de privacidade de "Limelight" e em "Vital Signs", mistura um refrao dramatico a um reggae futurista. "The Cameras Eye" é um referencial urbano em vez de mundos de fantasia. Este disco foi confirmado como quadruplo de platina, o album mais vendido ao longo de 30 anosda carreira (ainda em andamento) do Rush.

Joy Division - Closer (1980)


"É como se compor este album tivesse piorado o seu estado: deixou-se tragar por ele, em vez de apenas expressa-lo." Tony Wilson, 1994
Mais de 25 anos depois, continua sendo quase impossivel separar a atmosfera inquietante da musica do Joy Division, a degradação da personalidade de seu vocalista e seu suicidio repentino. Ainda que o album de estreia, Unknown Pleasures, olhasse fundo para o abismo, era apenas musica. Closer é diferente.Comparado a seu antecessor, mais violento e convencional, esse disco é um salto quantico. As musicas se desviam da formula essencialmente punk que a banda usou em seus primeiros anos. Se a atmosfera sombria de Unknown Pleasures vinha em grande parte do uso revolucionario que o produtor Martin Hannet fez de efeitos digitais, aqui a propria musica soa exotica -- dos ritmos estranhos e militares de "Colony" às guitarras histéricas e cheias de efeitos de "Atrocity Exhibiton". A adição de sintetizadores (sobretudo em "Isolation" e "Heart and Soul") indica que, se Ian Curtis tivesse permanecido na banda, ainda assim ela pareceria o que se tornou, mais tarde, o New Order. O ambiente criado por Hannet é praticamente um instrumento. Se antes ele fornecia um fundo melancolico, aqui seus delays e reverberações caracteristicos são parte da propria estrutura das musicas, tornando-as ainda mais soturnas. Contudo, é nas ultimas tres faixas que fica claro, em retrospecto, que não existia mais separação entre o tormento pessoal de Curtis e as suas letras líricas e melancolicas. O Projeto grafico da capa, uma lápide, havia sido elaborado muito antes da morte do cantor e pode ser visto como uma infeliz coincidencia, mas é dificil não interpretar esse album terrivelmente amargo como um bilhete suicida.

terça-feira, 11 de dezembro de 2007

Joy Division




Joy Division
Por Ricardo Augusto Fernandes


Quando o furacão punk varreu o Reino Unido em 1976, muitos jovens se espelharam no exemplo dos Sex Pistols e do Clash e incentivados pelo lema "faça você mesmo", decidiram montar uma banda. Morando na região de Manchester, na época apenas uma cidade industrial esquecida no norte da Inglaterra, os amigos de infância Bernard Sumner, Peter Hook e Terry Mason mesmo sem experiência musical anterior, começaram a tocar guitarra, baixo e bateria respectivamente.
À procura de um vocalista encontraram Ian Curtis, que era uma presença freqüente nos mesmos shows de rock que o grupo costumava assistir. Todos se esforçavam em aprender a tocar seus instrumentos e a cantar, mas na verdade Terry Mason era péssimo baterista, e logo foi substituído por Tony Tabac e depois por Steve Brotherdale, que apesar de saberem tocar bateria, não se adaptaram conforme esperado ao grupo. O baterista definitivo seria Steve Morris, o único a responder a um anúncio colocado em uma loja de discos. Após passar alguns meses ensaiando sem ter um nome certo, escolheram o nome Warsaw, baseado na música "Warszawa" do disco "Low" de David Bowie, lançado poucos meses antes, em janeiro de 1977.
Ian possuía um gosto musical vasto e eclético, contribuindo na formação musical dos outros músicos, apresentando a eles discos de Lou Reed, Iggy Pop e Kraftwerk. Ao mesmo tempo, começaram a fazer alguns shows em sua região natal, junto a toda uma nova geração de bandas que estava se formando.
O início do ano de 1978 marcou a mudança do nome do grupo para Joy Division, devido a uma confusão com um grupo londrino de heavy metal chamado Warsaw Pakt. Chamavam-se "divisões do prazer" os alojamentos destinados às mulheres judias que eram obrigadas a se prostituir nos campos de concentração nazistas. A escolha do nome foi de Ian Curtis, que era obcecado por tudo que fosse alemão.
Em junho de 1978 lançaram em esquema totalmente independente um EP contendo quatro músicas chamado "An Ideal For Living". Neste mesmo ano, chegaram a gravar um LP para a RCA que nunca chegou a ser lançado, pois o grupo rejeitou a produção e os sintetizadores adicionados posteriormente à gravação. O Joy Division já tentava buscar uma sonoridade própria, procurando se afastar dos clichês punk. O album se tornou disponível em cópias piratas e quem quiser conferir esta transição do grupo, pode encontrar o disco geralmente sob o nome de "Warsaw".
A grande mudança para um novo caminho musical surgiu quando o Joy Division começou a trabalhar com o jovem produtor Martin Hannett, que lhe extraiu uma sonoridade única, sombria, densa e misteriosa. Quando o album "Unknown Pleasures" foi lançado em junho de 1979, foi aclamado pela crítica inglesa como um dos melhores discos de estréia de todos os tempos. "Unknown Pleasures", editado pelo hoje lendário selo Factory, trazia uma mixagem inconvencional, com o baixo e a bateria à frente, junto aos efeitos criados em estúdio por Hannett, deixando ao fundo a guitarra e os versos desesperados de Curtis, com certeza um dos maiores poetas que o rock já teve.
Os shows do Joy Division eram um capítulo à parte. A banda ficava imersa em sombras, tocando seus instrumentos de maneira estática, destacando-se a dança maníaca de Ian Curtis, que sofria de epilepsia e repetia inconscientemente os movimentos que fazia durante seus ataques. O Joy já possuía um grupo fiel de admiradores, que seguia o grupo onde fosse e se vestia à maneira austera da Alemanha dos anos 40.
Em dezembro de 1979 e janeiro de 1980, fizeram uma bem sucedida turnê européia, em um total de 11 shows por países como França, Alemanha, Bélgica e Holanda. As gravações para o segundo album ocorreram em março, novamente produzido por Martin Hannett, mas desta vez destacando-se a utilização de teclados, que eles mesmo haviam renegado no passado. Para a gravação, foi construída no estúdio uma abóbada de estuque, a fim de reproduzir a ressonância de uma capela.
No mês seguinte vários shows foram cancelados devido a problemas de saúde do vocalista. Uma turnê americana de 3 semanas estava prevista para iniciar em maio, mas o grupo nem chegou a embarcar. No dia 18 de maio de 1980, Ian Curtis foi encontrado morto em sua casa em Macclesfield. Por menos romântico que possa parecer, hoje se sabe que ele se enforcou na cozinha com uma corda utilizada como varal. Os motivos prováveis para seu suicídio foram sua epilepsia cada vez mais constante e a dissolução de seu casamento. Quando o single "Love Will Tear Us Apart" saiu em maio, pela primeira vez o grupo chegou ao Top 20 britânico. O album "Closer" lançado no mês seguinte, considerado a grande obra-prima do Joy, repetiu a mesma façanha. Ironicamente, o Joy Division atingiu sua maior popularidade quando já havia acabado e Ian Curtis nunca chegou a ver o sucesso que ele desejava tanto para seu grupo. O lançamento do album "Still" em 1981, com sobras de estúdio e a gravação de seu último concerto, aumentou ainda mais o mito em torno do grupo.
Hoje em dia a importância do Joy Division pode ser avaliada pelos diferentes grupos que influenciou e pelas covers que foram gravadas posteriormente, de Bush a Nine Inch Nails, passando por Swans e Galaxie 500. Os sobreviventes do grupo continuaram como New Order, mas isto já é outra história...
Discografia:
An Ideal For Living (EP, 1978)
Unknown Pleasures (1979)
Closer (1980)
Still (1981)
Substance (1988)
Permanent (1995)
Heart And Soul (CD Box Set, 1997)

The Buzzcocks




The Buzzcocks
Por Márcio Ribeiro

http://www.geocities.com/punksocietybr/buzzcock.htm

The Buzzcocks é uma das bandas punk mais populares e certamente uma das mais influentes. Diferente da revolta política muito em voga em bandas como os Sex Pistols, Pete Shelly escreve letras angustiadas, às vezes engraçadas, sobre amor com a perspectiva típica dos adolescentes. A banda por sua vez entrega o recado com intensidade, velocidade e fúria em canções melodicamente pop de no máximo três minutos, soando quase como um cruzamento entre os Sex Pistols e os Monkees.
Peter McNeish e Howard Traford se conheceram no Bolton Institute of Technology (Instituto de Tecnologia de Bolton) em 1975. Ambos gostavam de ouvir Velvet Underground e Howard era particularmente fascinado pelo som dos Stooges. Arrumaram um baterista e formaram um trio para tocar despretensiosamente, cobrindo qualquer coisa desde Stooges a Brian Eno. Depois de um tempo a brincadeira acabou mas continuaram amigos e acabaram indo juntos assistir duas apresentazções dos Sex Pistols em Londres. O efeito desses shows, foram para esses dois rapazes a mola propulsora de toda a carreira.
Voltam para casa com o firme propósito de montar uma banda punk. Formam então os Buzzcocks, para serem em Manchester o mesmo explosivo sonoro que os Pistols estavam sendo em Londres. Como seu mentor Johnny Rotten, mudam seus nomes; Peter McNeish se torna Pete Shelly e Howard Traford torna-se Howard Devoto. A banda ainda incluiria Garth Smith no baixo enquanto a bateria continuou por um longo período sem dono fixo. Depois de muitos ensaios, procuraram e propuseram aos Pistols uma apresentação em Manchester, onde os Buzzcocks abririam para eles. Porem, às vésperas da apresentação, Garth e o baterista na ocasião, pulam fora.
O show dos Pistols transcorreu-se com o habitual impacto, sendo um tremendo sucesso. Assistindo entre o público, Shelly e Devoto conhecem Steve Diggle, que é então convocado para assumir o baixo. Por último, através de um anúncio no jornal Melody Maker conhecem John Maher. Passam os próximos meses ensaiando, até estarem prontos para sua estréia, em julho de 1976, novamente abrindo para Sex Pistols no Lesser Free Trade Hall, em Manchester.
A partir daí Buzzcocks não para mais, tocando sucessivamente pelos próximos três anos e fazendo de Manchester a segunda capital do punk, perdendo apenas para Londres. Gravam em outubro um álbum demo que incluiria You Tear Me Up, Love Battery, Boredom, Breakdown e Orgasim Addict. Enfim, boa parte do que é encontrado no futuro disco oficial e mais alguns futuros compactos. No final do ano excursionam com os Pistols e toda uma aglomeração de bandas punks, no que ficou conhecido como The Anarchy Tour. Entre essas bandas estão The Damned, The Clash, Generation X e The Sluts. Registrando o evento, o DJ e cineasta David Letts filma tudo em super-8, lançando mais tarde com o nome de The Punk Rock Movie.
Pete Shelly consegue negociar um empréstimo com seu pai para bancar as gravações do seu primeiro compacto. Assim nascia Spiral Scratch, o primeiro vinil da banda, como também, o primeiro projeto feito na base do "faça você mesmo" na história do punk. A partir da iniciativa de Shelly, inicia-se toda uma filosofia e tendência nova no comportamento do mercado que alteraria a industria. Gravado no dia 28 de dezembro de 1976, o compacto inclui as músicas Breakdown e Times Up no lado A e Boredom e Friends of Mine no lado B; todas composições da dupla Shelly-Devoto. Uma curiosidade a se divulgar é que tudo foi gravado em um só take com o solo de guitarra gravado posteriormente, em overbub. A exceção seria Boredom, que foi sem overdubs, gravado direto do terceiro take. Não se grava música assim desde Please, Please Me em 1963. Foram confeccionadas mil cópias e lançadas em janeiro de 1977, vendendo bem.
Por volta de março Devoto larga a carreira musical para voltar aos estudos. Pete Shelly assume os vocais e Steve Diggle larga o baixo assumindo a segunda guitarra. Para o baixo, volta Garth Smith. O nome Buzzcocks já atrai um público específico; todo um estilo punk e sua música pronto para ferver, apesar da total falta de apoio da mídia. Somente em setembro, os Buzzcocks assinam com United Artists um contrato que lhes permitiriam toda liberdade artística. Para testar essa liberdade, sai em outubro o single de estréia, Orgasm Addict (Viciado em Orgasmo) que é banida das rádios BBC mas que consegue sua vendagem na base do boca a boca. Podem imaginar isso hoje em dia? Obter um sucesso comercial sem nenhum apoio das rádios? Pelo contrário, com sucessiva propaganda negativa na mídia contra o estilo?
No decorrer desses eventos, Howard Devoto volta à cena musical e funda a banda Magazine. Garth Smith é sumariamente dispensado e no seu lugar entra Steve Garvey. Está formação permanece até o fim do grupo em 1981 e pode ser chamado de a formação clássica da banda. No final do ano, o segundo single What Do I Get? atinge o topo das paradas e abre o caminho para o LP de estréia, Another Music In A Different Kitchen, em março de 1978. Guitarras cortantes como serra elétrica e a veia pop tão característico de Shelly fazem deste, um disco 100% Punk, um monumento a sua época. É difícil não se encantar com o peso, velocidade e agressividade de temas como Fast Cars, You Tear Me Up, Love Battery, Autonomy, Fictionromance ou I Don't Mind.
A banda lança uma serie de compactos até que em setembro, chega as lojas Love Bites, o segundo LP. Um álbum com dois temas instrumentais, Walking Distance e Late For The Train, além dos usuais temas tão típicos de Shelly; Real World, Ever Fallen In Love, Nostalgia, Just Lust, Sixteen Again, Nothing Left e ESP. Em 1979 a banda começa a mostrar sinais de esgotamento, mas ao invés de descansarem, entram no estúdio e gravam o terceiro LP: A Diferent Kind Of Tension. O álbum é possivelmente o menos "energizado" da banda, embora nele estão incluídas clássicas composições de Shelly como Paradise, You Say You Don't Love Me, I Don't Know What To Do With My Life e I Believe. O álbum é lançado em agosto e em seguida viajam para sua primeira excursão na América. Durante a sua passagem, os americanos lançam a coletânea, Singles Going Steady. Com apenas quatro músicas encontrados nos dois primeiros álbuns, essa coletânea oferece material disponível até então, apenas em compactos. Este talvez seja o disco mais indicado para se avaliar as composições de Pete Shelly, o grande hit maker da geração punk.
Em 1980, a banda tira férias do palco, diminuindo para um mínimo as apresentações ao vivo. Esse mínimo incluiu uma excursão americana. Gravam as músicas para o projeto Part 1 - 3, que a gravadora lança como três compactos simples (Part 1, Part 2, Part 3) durante o ano. Preparam-se para gravar material para o quarto LP em início de 1981, porém a EMI, que comprara no ano anterior a United Artists, insiste que Singles Going Steady seja lançado na Inglaterra antes de bancar outro álbum. A banda recusa a exigência da gravadora e Shelly decreta o fim dos Buzzcocks, livrando-se assim do contrato. Part 1 - 3, acaba saindo em formato de LP em 1984 pelo selo IRS.
Ainda em 1981, Pete Shelly lança o single Homosapien seguido de um LP com o mesmo nome pelo selo Arista. O disco oferece bastante do potencial pop característico do seu trabalho mas em um ambiente totalmente novo. Muitos teclados, substituindo inclusive os baixos; uma bateria eletrônica somado a uma bateria viva, embora esta sem muita presença. É como se Shelly quisesse mesmo se ouvir longe do som que lhe fez famoso. Temas como Homosapien, Yesterday's Not Here, Love In Vain, Witness Of Change, telephone Operator, Guess I Must Have Been In Love With Myself e I Generate A Feeling se tornam uma interessante releitura tecno da musicalidade de Shelly. I Don't Know What It Is e In Love With Somebody Else tem guitarras mais presentes e provavelmente teriam constando no álbum que a EMI não quis financiar.
Steve Diggle e John Maher formam Flag Of Convenience enquanto Steve Garvey se muda para New York e lá toca com uma banda local chamada Motivation. Todos esses trabalhos acabaram tendo carreira curta sendo substituídos por outros projetos. Até que o quarteto se reuniu novamente em 1989 e passam a excursionar pelos Estados Unidos. Em 1990 Maher sai e no seu lugar entra Mike Joyce, ex- baterista dos Smiths. Ele continua até o final daquele ano mas, tanto ele quanto Garvey, cansados das constantes turnês, acabam saindo.
Uma nova formação com Shelly e Diggle, mais Tony Barber no baixo e Phil Barker na bateria passa a excursionar. Em 1993 a banda lança o primeiro CD com material inédito, Trade Test Transmission. Um Cd dinâmico que mostra como Shelly não perdeu o jeito para compor melodias que pegam. Mantendo a tradição, a banda excursiona sem parar, acabando por chegar no Brasil. Apresentam-se num domingo de novembro em 1995 no Garagem, reduto punk e metal, situado numa dessas áreas mais movimentadas a noite, ao lado do conhecido reduto das refugiadas da Vila Mimosa, o ponto das meretrizes mais gastas da cidade do Rio de Janeiro.
Em sua passagem pelo Brasil, o show incluiu I Don't Know What To Do With My Life, Unthinkable, Last To Know, When Love Turns, I Don't Mind, Love You More, Autonomy, Get On Your Own, Do It, Isolation, Why Can't I Touch It?, Fictionromance, Why She's A Girl From The Chainstore, Breakdown, Promises, Noise Annoys, Harmony In My Head, I Believe, What Do I Get?, Orgasm Addict, Fast Cars, Boredom, You Say You Don't Love Me, Oh Shit! e Ever Fallen In Love. O tempo passa mas essa banda continua com uma apresentação convincente para um público que queira saborear o autêntico punk dos anos setenta.
Seis meses depois, na primavera de 1996 lançam All Set. Depois de tantos anos, não se pode esperar a mesma fúria de quando se é um adolescente. O disco está longe de ser fraco ou de se perceber perda no potencial pop de suas composições, mas infelizmente este CD passou despercebido. Demoraria mais três anos até que em 1999, Pete Shelly e banda lançam outro CD com canções novas chamado simplesmente, Modern. Aqui, a banda utiliza mais parafernália eletrônica, principalmente nas composições de Steve Diggle. Temas bons dentro da habitual atmosfera pop fazem os Buzzcocks continuar a soar melhor do que a maioria das bandas punk ainda em atividade.
Discografia:
· Another Music In A Different Kitchen (1978)
· Love Bites (1978)
· A Diferent Kind Of Tension (1979)
· Singles Going Steady (1979)
· Trade Test Transmition (1993)
· All Set (1996)
· Modern (1999)

ARNALDO ANTUNES "Ao Vivo em Estúdio"


ARNALDO ANTUNES "Ao Vivo em Estúdio"
"Arnaldo Antunes ao Vivo no Estúdio" é um show baseado no repertório do álbum "Qualquer" (2006) e em clássicos da carreira solo do ex-titã, que já dura mais de uma década. É um show intimista, gravado no estúdio paulistano Mosh em 14 de agosto de 2007, na presença de uma platéia de 50 pessoas.

No primeiro CD e DVD ao vivo de Antunes, as canções simples e com letras de alta qualidade poética do compositor ganham um acompanhamento "quase" acústico, sem bateria, com mais jeito de balada que de rock, e que ajudam a característica voz grave de Antunes a sobressair. Betão Aguiar e Chico Salem tocam os violões e fazem vocais, e Marcelo Jeneci (parceiro de Antunes em "Quarto de Dormir", única inédita do DVD), toca teclados, sanfona e também ajuda nos vocais.

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Gravadora: Biscoito Fino Preço médio: R$ 22 VEJA TRECHO DO DVD

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Novos Baianos - Acabou Chorare (1972)



A década de 60 acabou seis meses antes, nas noites de 20 e 21 de julho, no Teatro Castro Alves, em Salvador, no show de despedida deCaetano Veloso e Gilberto Gil. Na platéia, do poeta Augusto de Campos a inúmeros órfãos. No palco, Gil, Caetano e o grupoOs Lief´s (Pepeu, Lico, Carlinhos e Jorginho). O show-réquiem dava o sinal: A Navilouca antropófago-tropicalista devia seguir.

Os Novos Baianos surgem, num batismo de fogo, nestas noites negras. O cantor, compositor e violonista Moraes Moreira, o poeta-agrônomoGalvão, o crooner de baile Paulinho Boca de Cantor e a cantora Baby Consuelo, inicialmente acompanhados dos Lief´s, seguem transformandocinzas em melodias. Desclassificação em festival, shows-happenings, um LP e dois compactos serviriam de ensaio geral.

Em 1972, já ocupando um apart-tribo no Rio, os NB gestavam um manifesto. Uma ilustre visita daria o toque final, a do mago João Gilberto.João abre seu baú de canções dos anos 30 e 40 e se mistura ao rockarnaval dos Novos Baianos.O LP Acabou Chorare, primeiro lançamento da gravadora Som Livre, seria a síntese desta viagem hard-pós-tropicália-João Gilberto.

O título sairia de um brinde-balbucio de bebê, que Bebel Gilberto - née Isabel - , filha de JG e Miúcha, sussurraria nas jams.

O samba-batucada "Brasil Pandeiro", de Assis Valente, lançado em 1940, por um dos mitos de João, o grupo Anjos do Inferno, abre o disco.O grande Hit "Preta Pretinha", uma colagem cinematográfica saída de algum alto-falante do interior, serve de abre-alas e da passagem a "Tininho Trincando", uma bossa-baião-hard com texto mínimo e onomatopéico, que Baby pulveriza sobre A Cor do Som, isto é, Pepeu,Dadi, Jorginho e Baixinho, a parte elétrica dos NB.

"Swing de Campo Grande" e "Acabou Chorare", entregue à parte acústica nos NB, fecham o lado A, zanzando entre o batuque e seresta-bossa."O Mistério do Planeta", na voz de Paulinho, relê uma velha canção do grupo Míni Planeta Íris, o texto confessional dá um grito de basta na barra lúcifer da época. A canção seguinte, na voz de Baby, "A Menina Dança", continua o desnudar de barras: "...só entro no jogo / porque estou /estou mesmo depois / depois de esgotar / o tempo regulamentar..."

"Besta é Tu", com Moraes , em ironia máxima ("...não viver este/ se não há outro mundo..."), transpirava, naquele negro tempo, uma linguagemcifrada, pela sua desconcertante simplicidade carnavalesca. "Um bilhete para Didi", única música instrumental, serve de territorio pra A Cor do Somdar seu vôo. Uma versão de "Preta Pretinha", fecha o disco, sendo que, no show, "Preta Pretinha" entra em um pout-pourri-bricolagem com "29 Beijos", do primeiro compacto e "Oba-lá-lá", bossa baião de e do antológico primeiro disco de JG. Era a proposta sintetizada em som e cena.

Acabou Chorare, além da síntese sonora - Jimi Hendrix empunhando um cavaquinho (por sinal, presente de Paulinho da Viola a Pepeu) e JG, umaguitarra distorcida -, traz, em sua primeira edição (em 1984, foi relançado com capa simples), uma das mais interessantes e surpreendentes capas.Um texto de Augusto de Campos dá o tom, outro de Galvão explica a antifamília NB e várias fotos quebram os olhos dos censores. Na contracapa,uma superposição: um NB e um dos filhos da troupe fumam o mesmo "baseado", como se ilustrassem, em silêncio, o projeto obra-viagem do grupo.

Barras se sucederam a barras.

Acabou Chorare, em som, imagem e silêncio, foi um de seus melhores closes.
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