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quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

Novos Baianos - Acabou Chorare (1972)



A década de 60 acabou seis meses antes, nas noites de 20 e 21 de julho, no Teatro Castro Alves, em Salvador, no show de despedida deCaetano Veloso e Gilberto Gil. Na platéia, do poeta Augusto de Campos a inúmeros órfãos. No palco, Gil, Caetano e o grupoOs Lief´s (Pepeu, Lico, Carlinhos e Jorginho). O show-réquiem dava o sinal: A Navilouca antropófago-tropicalista devia seguir.

Os Novos Baianos surgem, num batismo de fogo, nestas noites negras. O cantor, compositor e violonista Moraes Moreira, o poeta-agrônomoGalvão, o crooner de baile Paulinho Boca de Cantor e a cantora Baby Consuelo, inicialmente acompanhados dos Lief´s, seguem transformandocinzas em melodias. Desclassificação em festival, shows-happenings, um LP e dois compactos serviriam de ensaio geral.

Em 1972, já ocupando um apart-tribo no Rio, os NB gestavam um manifesto. Uma ilustre visita daria o toque final, a do mago João Gilberto.João abre seu baú de canções dos anos 30 e 40 e se mistura ao rockarnaval dos Novos Baianos.O LP Acabou Chorare, primeiro lançamento da gravadora Som Livre, seria a síntese desta viagem hard-pós-tropicália-João Gilberto.

O título sairia de um brinde-balbucio de bebê, que Bebel Gilberto - née Isabel - , filha de JG e Miúcha, sussurraria nas jams.

O samba-batucada "Brasil Pandeiro", de Assis Valente, lançado em 1940, por um dos mitos de João, o grupo Anjos do Inferno, abre o disco.O grande Hit "Preta Pretinha", uma colagem cinematográfica saída de algum alto-falante do interior, serve de abre-alas e da passagem a "Tininho Trincando", uma bossa-baião-hard com texto mínimo e onomatopéico, que Baby pulveriza sobre A Cor do Som, isto é, Pepeu,Dadi, Jorginho e Baixinho, a parte elétrica dos NB.

"Swing de Campo Grande" e "Acabou Chorare", entregue à parte acústica nos NB, fecham o lado A, zanzando entre o batuque e seresta-bossa."O Mistério do Planeta", na voz de Paulinho, relê uma velha canção do grupo Míni Planeta Íris, o texto confessional dá um grito de basta na barra lúcifer da época. A canção seguinte, na voz de Baby, "A Menina Dança", continua o desnudar de barras: "...só entro no jogo / porque estou /estou mesmo depois / depois de esgotar / o tempo regulamentar..."

"Besta é Tu", com Moraes , em ironia máxima ("...não viver este/ se não há outro mundo..."), transpirava, naquele negro tempo, uma linguagemcifrada, pela sua desconcertante simplicidade carnavalesca. "Um bilhete para Didi", única música instrumental, serve de territorio pra A Cor do Somdar seu vôo. Uma versão de "Preta Pretinha", fecha o disco, sendo que, no show, "Preta Pretinha" entra em um pout-pourri-bricolagem com "29 Beijos", do primeiro compacto e "Oba-lá-lá", bossa baião de e do antológico primeiro disco de JG. Era a proposta sintetizada em som e cena.

Acabou Chorare, além da síntese sonora - Jimi Hendrix empunhando um cavaquinho (por sinal, presente de Paulinho da Viola a Pepeu) e JG, umaguitarra distorcida -, traz, em sua primeira edição (em 1984, foi relançado com capa simples), uma das mais interessantes e surpreendentes capas.Um texto de Augusto de Campos dá o tom, outro de Galvão explica a antifamília NB e várias fotos quebram os olhos dos censores. Na contracapa,uma superposição: um NB e um dos filhos da troupe fumam o mesmo "baseado", como se ilustrassem, em silêncio, o projeto obra-viagem do grupo.

Barras se sucederam a barras.

Acabou Chorare, em som, imagem e silêncio, foi um de seus melhores closes.
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