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sábado, 15 de dezembro de 2007

Iggy Pop - The Idiot (1977)


Uma escolha insegura. Afinal, os dois LPs com os Stooges são punk puro sete anos antes dos Sex Pistols. Raw Power (72) é uma escarrada anfetaminada na cara do flower power. O semipirata Metalic K.O. é demência pura. O mundo dos espetáculos não via esse desprezo insolente pelo bem ou pelo “bem” desde as conferências vociferadas por Antonin Artaud, na década de 30. Segundo o Iggy de hoje, 39 anos de idade, talvez não precise mesmo ver de novo. Artaud morreu internado, Iggy foi salvo por David Bowie.
Gravado nos estúdios Hansa (Berlim Ocidental) e do Chateau d’Herouville (Paris), The Idiot tem, de fato, uma mão de Bowie além do que gostariam os raros e radicais fãs do Iguana. Na famosa “centena básica” do New Musical Express só entrou o posterior, Lust for Life. No lançamento, a crítica desceu a lenha, irritada pelo mesmo motivo.
O disco não esconde. “Música composta por Iggy Pop e sua banda, gravado por David Bowie” são os créditos dados na capa, e as oito faixas são atribuídas à parceria Bowie/Pop (ou Jones/Osterberg).
“Sister Midnight” abre, dando o tom e a paisagem gerais do disco: paredes ondulantes montadas à base de guitarras distorcidas e sobrepostas em vários canais, uma ou outra intervenção eletrônica à moda de Brian Eno – com quem Bowie começava a gravar a “trilogia berlinense”. Em Lodger (79), inclusive – o terceiro da série - , “Sister Midnight” aparece com o título “Red Money” e uma nova letra feita por Bowie.
Na história da “Irmã Meia-Noite”, porém, irrompe o segundo delírio edípico da história do rock’n’roll, tão denso quanto o de Jim Morrison.Em suas “memórias”, I Need More, Iggy conta a fonte de inspiração. Uma vez, quando quase adolescente, estava começando a se entender com a filha de uma família vizinha, quando seu pai o chamou e o proibiu de chegar perto da garota. “Chamando irmã meia-noite/ sabe, tive um sonho essa noite/ mamãe estava na minha cama/ eu fazia amor com ela/ meu pai veio me caçar com sua pistola de seis tiros/ chamando irmã meia-noite/ que é que eu posso fazer com os meus sonhos?”
Na seqüência, a música que seria a faixa-título de um LP também antológico, de Grace Jones. “Nightclubbing” poderia ser o hino do vampirismo e das madrugadas viradas em festa, mas tem um andamento lento, quase fúnebre. Iggy se esparrama sobre ele como o crooner que Peter Murphy adoraria ser. Nightclubbing estamos Nightclubbing, andamos como um fantasma/ aprendemos novas danças, como a bomba nuclear.”
A faixa seguinte, “Funtime” (título do segundo dos Stooges), faz uma ponta no filme The Hunger (fome de viver) e não só pelo verso “a noite passada, estive no laboratório, conversando com Drácula e sua turma”. Entre ela e “Nightclubbing”, a mesma rede de conexões entre diversão e cinismo, que vai avolumando como uma nuvem cinza-chumbo no primeiro lado do disco para baixar a chuva ácida, que vem do outro.
Antes porém, mais duas faixas. “Baby” sai do tom de lamento para cantar: “Baby, você é tão limpa/ por favor continue limpa/ baby, você é tão jovem/ por favor continue jovem/ baby, não chore/ nós já choramos”. A última o mundo inteiro conhece na gravação de Bowie, que foihit em 83 (segundo consta, só os direitos autorais de “China Girl” tiraram Iggy de uma situação de penúria eterna). Aqui, ela obedece ao tom do LP, simultaneamente mais lúgubre e mais sóbria que a de Bowie. O lado B tem apenas três faixas. “Tiny Girls” é uma pérola de romantismo e decepção, com um belo solo de sax do anjo da guarda salvador.Está encravada entre “Dum Dum Boys”, um olhar nostálgico para os Stooges, e a tecno-esquizóide “Mass Production”. Ambas longas e soturnas, e Iggy bufa com o sopro do demo, mas para se chegar ao oásis de “Tiny Girls” você precisa passar por uma das duas.

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